O desenvolvimento cientifico teve respaldo na observação dos fenômenos naturais, tanto ocorridos no ambiente, como em organismos vivos, ou melhor como o ambiente influencia os organismos vivos e vice-versa. A bioquímica se ocupa também na analise a partir da observação de fenômenos em organismos vivos e a forma como o meio pode vir a alterar essas reações. Os princípios da analise médica também segue essa linha de raciocínio, buscando quais mudanças de hábito ou ambientais interferiram de modo a provocar mutações e doenças. Diversas vezes a história anda de mãos dadas com a ciência.
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Existe uma passagem pouco conhecida da segunda guerra
mundial, mas nem por isso menos dramática, conhecida por Hongerwinter, ou “Inverno da
Fome”. Após o desembarque dos aliados nas praias da Normandia, já quase no
final do conflito (1944-1945), episódio conhecido por Dia D, o exército alemão se reagrupou no oeste da Holanda cortando
os suprimentos para a população civil. Como consequência os habitantes dessa
região só podiam contar para seu sustento com o que pudessem extrair da terra.
Mas isso não foi tudo, para o agravamento da situação as condições climáticas
desse ano foram severas, com um inverno longo e bastante rigoroso, o que logo
prejudicou qualquer forma de cultivo da terra. Ainda, como tática de guerra o exército
nazista dinamitou os diques holandeses e boa parte das terras férteis foi
inundada, isso para evitar que os aliados utilizassem esse território como corredor
para invadir a Alemanha. Toda essa situação acarretou que entre setembro de
1944 e os primeiros meses de 1945 aproximadamente 22.000 holandeses morressem
de fome e as sequelas nos sobreviventes se estendessem por pelo menos uma
geração.
Retornando ao exposto no
primeiro parágrafo, a ciência se debruça a observar os fenômenos, e por sua
severidade, o Hongerwinter representou um experimento macabro. Durante as
últimas décadas cientistas se debruçaram no estudo dos efeitos da fome severa
nos sobreviventes desse terrível episódio. De particular interesse foi a
análise das consequências da desnutrição no desenvolvimento do cérebro e na
cognição das crianças que nasceram ou foram concebidas nesse período. Entre
muitos outros resultados os cientistas observaram que a desnutrição pré-natal
aumentou o risco para o surgimento tardio (durante a adolescência ou fase
adulta) de alterações patológicas e comportamentais como Transtorno do Déficit
de Atenção e Hiperatividade (TDAH), autismo e, fundamentalmente, esquizofrenia.
E afinal, qual a relação da desnutrição infantil e da fome geral que assolou a
Holanda no Inverno da Fome com a
obesidade? Uma grande quantidade de estudos sugere que condições ambientais
desfavoráveis a um genitor podem afetar – negativamente – a saúde das gerações
subsequentes. Por exemplo, mulheres holandesas que estavam grávidas durante
esse período tiveram filhos e netos que eram incomumente pequenos ou propensos
à diabetes ou obesidade.
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Alguns
cientistas suspeitam que estes efeitos sejam passados adiante através de
mudanças epigenéticas. O termo epigenética é
relativo às mudanças reversíveis e herdáveis do genoma funcional que não
alteram a sequência de nucleotídeos do DNA. Em outras linhas, fazem parte da
epigenética o estudo de como os padrões de expressão são passados para os
descendentes, a investigação da mudança de expressão espaço temporal de genes
durante a diferenciação de um tipo de célula e também o estudo de como fatores
ambientais podem gerar alterações na maneira como os genes são expressos. A
pesquisa na área da epigenética inclui implicações em agricultura, na biologia
e em doenças humanas, incluindo o entendimento sobre células-tronco, câncer e
envelhecimento.
Anteriores estudos de associação ampla de genoma (GWAS, Genome-Wide Association Studies) identificaram um grande número de
variantes genéticas para a obesidade e seus traços relacionados, o que
representa um grupo de potenciais genes-chave na etiologia da obesidade. Emergiram evidências que sugerem que epigenética pode
desempenhar um papel importante na obesidade . O
excesso de peso pode causar alterações genéticas. O estudo foi feito pelo
epidemiologista genético Shaoyong Su, da Georgia Regents University, nos
Estados Unidos.
Quantas
vezes você não viu uma família em que grande parte são “gordinhos”? A ciência
já sabia que a obesidade pode ser hereditária, além disso, estudos recentes
indicam que a alimentação gordurosa pode causar alterações genéticas, ou seja,
os maus hábito alimentares e o ambiente podem provocar alterações em certos
genes. Ao analisar parte do genoma de 703 pessoas obesas, magras e com
sobrepeso, o pesquisador percebeu que o gene LY86 sofreu uma metilação, que é uma forma de o corpo se ajustar ao seu ambiente, nos
estudos Shaoyong Su encontrou a consistência química do LY86 altamente
alterada, ou desnaturada, nos indivíduos obesos. "A associação é sólida;
a metilação deste gene é importante para a obesidade" segundo ele.
Isso significa que houve uma mudança química no genoma,
como se fosse uma forma do organismo se adaptar ao "novo" ambiente. Essa
metilação ocorreu em bebês de mulheres que estavam gravidas durante o Hongerwinter, essa mudança genética aconteceu
para que eles conseguissem sobreviver nesse cenário calamitoso da fome, provocando
essa maior propensão ao acumulo de triglicerídeos, importante reserva de
energia. Quando o país superou a crise, essas crianças apresentaram um risco
elevado de desenvolver diabetes, doenças cardíacas e outros problemas de saúde.
Todas doenças relacionadas a quadros de obesidade, a alta
metilação de LY86 também foi associada com aumento da inflamação - um fator de
risco para uma variedade de doenças, tais como doenças cardíacas e câncer -,
bem como a resistência à insulina, uma causa de diabetes.
Através desse cenário apresentado, é possível
identificar que a obesidade também deriva de fatores que são inatos ao indivíduo
– fatores genéticos – que geram uma maior facilidade em adquirir peso, no
entanto isso não implica na maioria dos casos, que a pessoa venha a desenvolver
a doença crônica, caso tenha uma vida saudável.
Referências:
http://www.polyteck.com.br/blog/subnutricao-durante-gestacao-pode-alterar-expressao-de-dna-por-duas-geracoes/
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://ciencia.folhadaregiao.com.br/2012/10/hongerwinter.html
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://pt.wikipedia.org/wiki/Carestia
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4090018/
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://hypescience.com/obesidade-pode-causar-alteracoes-geneticas/
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://www.sciencedaily.com/releases/2013/03/130321133114.htm
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://gru.edu/institutes/gpi/su.php
<acessado em 28 de novembro de 2014>;
http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/obesidade-pode-causar-alteracoes-geneticas-
diz-estudo <acessado em 28 de novembro de 2014>.